CUIABANÁLIA:
Ah! cuiabanália . . .
Cidade intoxicada do bagaço
tecnetrônico
estereofônico
biônico
supersônico
agônico
ATÔMICO
Onde o viver canônico
à sombra cheirosa dos quintais em flor?
narcotizou-se o amor?
Ah! cuiabanália . . .
Agora, espigões, néon,
excesso de decibéis,
jeans, gatonas trepadas
no lombo rouco das motos
superlotando os motéis.
Só há rock, drive-in,
lanchonete, pizzaria
e o terror dos quartéis,
Onde a boa putaria?
(O bom era o Beco do Candieiro
a desembocar no Bar Colorido,
com o beijo disputado na valentia)
Ah! cuiabanália...
Pobre não mora, formiga
nas favelas do BNH.
Rico vira executivo
e coça no CPA.
Onde a Cuiabá telúrica
parindo a raça viril
emprenhada por sutil?
Ah! Cuiabá canalha
- c u i a b a n á l i a-
cortesã das multinacionais
com seu arsenal eletrônico
agônico
estereofônico
biônico
supersônico
ATÔMICO
Ah! cuiabanália . . .
Onde a Cuiabá pudenda
das igrejas, candomblés
e dos pios cabarés?
Já não há virgens postiças
nas escolas enfermiças.
A boemia e seus vícios,
seus bêbados vitalícios.
Prostitutas sacrossantas
pelas ruas não há tantas.
Só há tóxico e frescura
poluindo a noite pura.
Ah! cuiabanália!
Êta cidade canalha!
Cuiabá metálica
neurótica
caótica
virótica
semi-ótica
estroboscópica
Cuiabá feia e fétida
esfingética
hermética
cibernética
Cuiabá caquética
Ah! cuiabanália...
Onde a Cuiabá erudita
doce e mansa
culta e santa
Cuiabá romântica
semântica
Dos artistas e poetas?
Onde a barroca matriz
O coreto e o chafariz?
Ah! cuiabanália . . .
Cuiabá morreu e
vou para San Sebastian
- fronteira do México com o Nepal -
Que tenho porre marcado
com Rimbaud, Chopin, Van Gogh
e São Francisco de Assis
(Cuiabá não é mais feliz)
CUIABANÁLIA CANALHA
*Poema reproduzido do livro "Cuiabanália", 2ª edição (Carlini & Caniato - 2018)
acervo familiar

"Ah! cuiabanália... / Pobre não mora, formiga / nas favelas do BNH. / Rico vira executivo / e coça no CPA." Um poema tão belo quanto forte, de saudoso cuiabano evocando as transformações da sua cidade natal, com uma estrondosa criticidade. Apesar de escrito no final do século passado, os versos tendem a perdurar eternamente pela sua qualidade e pelo fiel registro de seu tempo. Vem a calhar nesta edição que celebra os 303 anos de Cuiabá