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Alalaô ooô ooô |
Zé Bolo Flor (Dalva de Barros, 1989) |
Não falo da cuiabania autêntica nem tampouco dos “paus fincados”, porque todo mundo que vem prá cá logo vira um cuiabano, perde os trejeitos e os ares metropolitanos impessoais, pra ser gente boa e simples. Bem que uns demoram quase uma vida, mas viram cuiabanos, nem se for debaixo de sete palmos.
A conversa hoje é mesmo, infelizmente, falar mal da nossa cidade. Que está ruim, feia, abandonada... E cada vez mais quente. Haja sombra de mangueira pra tanto mormaço e haja grana pra climatizar nossas vidas, seja em casa, no trabalho, “na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapê”.
Junto com o calor de rachar, fazem a gente transpirar também (de raiva) os problemas de infraestrutura e as questões sociais, que trazem no bojo a criminalidade. Essa tem me parecido a Cuiabá do século XXI. De 2000 pra cá, ferro na boneca e o povo, povão mesmo, só que dança. Dizem que por aqui rola muito dinheiro. Acredito. Vejo cada carrão na rua e vejo casas que não são bem casas: são palacetes. No Brasil, parece que tem que ser assim: contraste. Se miséria e riqueza não conviverem, não é Brasil. É. Parece que Cuiabá se torna uma espécie de superlativo da imagem do Brasil.
Ano passado, quando a gente conheceu o Velho Mundo, muitas pessoas nos questionavam sobre como era o Brasil, que eles apontavam como a quinta economia do mundo ou coisa que o valha. Nem sempre eu sabia o que responder... A corrupção e o descaso com o erário público, sintomas da nossa sociedade viciada (não adianta jogar a culpa só nos polÃticos), também eram temas que me colocavam em xeque. Mas, voltemos a Cuiabá.
Uma cidade que ficou feia, que viu seus córregos e rios serem transformados em canal de esgoto, a maioria a céu aberto, viu suas ruas e calçadas sendo esburacadas, suas árvores sendo derrubadas,  vê o crime nos espreitando a cada esquina e o seu povo ser abandonado pela precariedade dos serviços públicos básicos: a educação e  saúde foram pro beleléu. E “diz que” vai sediar a Copa do Mundo.
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Nem lambari de esgoto, extinto |
E depois vem o meu pai e me descobre saudosista. Sou mesmo. Ganhei outro dia um presente curioso de um amigo: um DVD com três episódios daquela antiga série “Túnel do Tempo”. Queria ser um daqueles caras que viajavam pelo tempo, pra poder re-experimentar coisas da Cuiabá antiga. Pode ser aquela dos anos 70, quando cheguei aqui. Algo bem simples, assim, como um picolé de groselha do Sinfrônio.   Â
“lembrança velha:
a vermelha groselha
me dá na telha”
(Haikai, inspirado no picole de groselha do Sinfrônio)