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Segunda, 29 de novembro de 2021, 20h00 CONTO Contos dos bosques de Curitiba* Dalton Trevisan Nelsinho encostou a porta, encurralada a moça no canto: – É hoje. Roçou a sombra do lábio, a espinha na asa do nariz. Ela voltou-lhe a face: beijou-a ferozmente na boca. Fechou a porta, empurrando-a com o pé. Certa que iriam ficar nos toques e blandícias, pendurou-se ao seu pescoço. Pousou a mão no peitinho, ela se encolheu: vergonha do seio pequeno? Era dona experiente, sem provocá-la não conseguia nada: – Duvido seja carne – é borracha! – Não faça isso. Vem gente. – Suspirosa, pesando cada vez mais no seu ombro. – Se vem gente? O herói estendeu a mão, deu volta à chave: – Vem não. Arquejante, estalou os dois colchetes, ergueu-lhe a blusa. Ela que baixou o sutiã. Surgiram dois bocados cor-de-rosa: – Nunca vi coisinha mais linda! Ai, mãezinha do céu, aquilo sim era seio – dois de uma vez, sem mentira. Se apertasse o biquinho espirrava leite? Brasão de família, ela confidenciou que o da mãe era mais bonito. – Depressa. Vem gente. Risinho abafado, queixou-se de cócega. – Que maravilha – a mão cheia, ele sopesava o fruto. – Ó perfeição da natureza! Ares de distraída, olho ausente no teto: – Sou nervosa. Hoje estou fria. – Como é que você gosta? – Sem inspiração eu não posso. – Ah, é... Beijava-a raivoso, lábio inchado de mordida. Ela titilou a língua no céu da boca. O herói, sem sair do lugar, descreveu duplo salto mortal. Deslizou a mão no joelho, debaixo da saia cinza. Magra, usava anágua. Assustadiça, arregalou o olho: – Não. Não. Aqui não. – Seja boba. Conversinha em sussurrro, na ânsia louca do mais cobiçado prêmio da terra. – Querido, pode vir alguém. Na última resistência, vencida pela surpresa. Levantou-lhe a anágua e viu – o que ele viu? Babados, brincos e rendas da ilha da Madeira. – Ai, você me machuca. Da vacina contra varíola, queixou-se de íngua no braço. – Já faço benzedura de íngua. A bela soltou o botão da saia e correu o fecho. Agora de blusa e anágua. Sem blusa. Sem anágua, desfeita aos pés. Magrinha e branca, dava pena – deitou-a no sofá de couro vermelho. – Espere, meu bem. Ela derrubou o sapato, raspando na beirada o calcanhar. De joelho no tapete, Nelsinho babujou-lhe o seio. – Me olhe. Abra o olho. Toda trêmula, escondeu o rosto no seu ombro: – Sinto vergonha. Gemido abafado de terror: – Tenha pena de mim! – Juro que . . . Quem me dera um espelho, uma almofada, um anel mágico. – . . . não faço mal. Sem inspiração, a bela enterrou-lhe a unha no pescoço: – Me beije. Ai, meu amor – e rilhando com fúria os dentes. – Ai, me beije.
*Conto reproduzido do livro "Vampiro de Curitiba" ![]() Dalton Trevisan nasceu em 1925, na cidade de Curitiba. Já faturou alguns dos mais importantes prêmios da literatura brasileira. Somente o Jabuti já venceu quatro vezes. Seus contos são inigualáveis e completou em 2021 96 anos. Sua sua literatura já foi traduzida e publicada na Argentina, Holanda, Venezuela, Suécia, Dinamarca e Estados Unidos. Já lançou mais de quarenta livros de contos e está presente em antologias desse gênero em vários países
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Fonte: Tyrannus Melancholicus Visite o website: https://www.tyrannusmelancholicus.com.br/ |