Às vezes, um relâmpago*
Às vezes, um relâmpago…
Somos daqueles mortos que não estão
convencidos de estarem mortos,
sempre escondidos por detrás dos portões,
como ladrões, no fundo, por detrás da porta
da felicidade (mas com os cadarços
desamarrados), com nariz empinado, e à espera
de uma oportunidade para voltar. Bem, deixa pra lá,
mas pare de esputar nas paredes.
Às vezes, um relâmpago…
Falar, falar de cinzas, de orvalho, falar
com os olhos fechados e com os lábios que tagarelam
sozinhos, automaticamente, sem querer, falar
é como dizer: “nada. Paciência. Que assim seja.
Nos veremos de novo, não tema.”
Mas então a melancolia volta, como um estúpido,
e dou meia volta, corro para casa
por medo de que meu filho no berço
tenha pegado fogo.
Deixe-me estender uma mão, meninas, deixe-me
estender: a vida é uma valsa; um temporal.
Às vezes, um relâmpago…
*Poema reproduzido do site https://escamandro.wordpress.com/ , em publicação de Nayana Montechiari, doutoranda em Literatura Italiana pelo Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas da UFRJ. Nayana desenvolve pesquisa sobre o poeta italiano Emilio Villa com ênfase em tradução, poesia e artes visuais
reprodução

O italiano Emilio Villa (1914 - 2003) foi poeta, artista visual, tradutor, crítico de arte e estudioso da Bíblia. Seus poemas refletem conhecimentos de línguas modernas e antigas, incluindo italiano, francês, inglês, latim, grego, sumério, acadiano e até do "português brasileiro". Emilio viveu no Brail nos anos 1950 e envolveu-se com os poetas concretos. A maioria dos escritos de Villa foram impressos por pequenas editoras em toda a Itália, e muitos estão indisponíveis hoje (com informações do site Wikipedia)